A comichão dos 3 meses

Há quem diga que os relacionamentos morrem no casamento. Mentira. A maioria nem sobrevive aos três meses. É nessa altura que a paixão deixa de ter filtros vintage e começa a parecer-se com o que realmente é: uma experiência humana feita de manias irritantes, respirações barulhentas, silêncios desconfortáveis e discussões sobre onde jantar. Três meses; esse prazo de validade invisível em que o encanto começa a coçar por dentro e a convivência deixa de saber a mel e começa a saber a rotina.


No início, tudo parece promissor. As conversas duram horas, os beijos têm urgência, as promessas soam quase reais. Mas depois o tempo passa, e o que era excitante começa a ser previsível. A mensagem matinal já não arranca sorrisos, a forma como ele diz “já volto” deixa de ser adorável e passa a ser irritante, e até o cheiro que um dia te deixava tonto começa a incomodar. É aqui que nasce a comichão dos três meses: aquela vontade inexplicável de sair a correr sem olhar para trás, mesmo que, em teoria, tudo esteja “bem”.

Não se trata de falta de amor. É mais subtil e, por isso mesmo, mais perigoso. É como se a ilusão inicial tivesse cumprido o seu papel e deixado espaço para o real; e o real, sejamos honestos, raramente é tão excitante. O problema é que a maioria de nós confunde esse desconforto com sinal de que “não era para ser”. Fugimos ao primeiro bocejo, desistimos ao primeiro sinal de aborrecimento, como se o amor fosse suposto ser uma sequência interminável de fogos de artifício.


Talvez seja por isso que tantas histórias ficam pelo caminho antes mesmo de começarem a ser histórias. Porque confundir o fim da euforia com o fim do sentimento é quase um desporto coletivo. E porque, no fundo, todos queremos o êxtase sem o tédio, como se fosse possível ter verão eterno sem passar pelo inverno.


O problema é que a cada nova fuga levamos a mesma bagagem, só mudamos de companhia. Troca-se o rosto, mas o enredo repete-se. É sempre o mesmo filme com atores diferentes. E a plateia (nós próprios) já nem tem paciência para fingir surpresa.

A comichão dos três meses é, talvez, a maior prova de que não sabemos amar. Sabemos desejar. Sabemos consumir. Mas amar, no sentido cru e quotidiano da palavra, talvez nunca tenhamos aprendido. E é por isso que, em vez de chegarmos a uma relação, ficamos presos a uma série infinita de estreias que nunca chegam a segunda temporada.

E, sejamos honestos, ninguém termina uma relação aos três meses porque “acabou o amor”. Termina porque nunca houve amor para começar. Só a ilusão confortável de que, desta vez, ia ser diferente.


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