preciso depressa de tua empatia.
sinta comigo.
era uma felicidade suprema.
mas às vezes em seu lugar
vem o belo ódio dos que se amaram e se entredevoraram.
diga-me por favor que horas são
para eu saber que estou vivendo nesta hora.
cada instante é mortal.
o que é que na loucura da franqueza
uma pessoa diria a si mesma?
sim, o que te escrevo não é de ninguém.
e essa liberdade de ninguém é muito perigosa.
fico triste só para descansar.
chego a chorar manso de tristeza.
depois levanto e de novo recomeço.
quero ver se consigo prender
o que me aconteceu usando palavras.
guarda-roupa nunca está em lugar adequado:
desajeitado, intruso, triste, bondoso.
só o errado me atrai,
e amo o pecado, a flor do pecado.
minha candidez foi por ti pisada.
não me amaste, disto só eu sei.
estive só. só de ti.
e quero a desarticulação,
só assim sou eu no mundo.
só assim me sinto bem.
morrer deve ser uma muda explosão interna.
o corpo não aguenta mais ser corpo.
e se morrer tiver o gosto de comida
quando se está com muita fome?
e se morrer for um prazer,
egoísta prazer?
caminho encostada à parede.
arrepio-me diante de mim.
por que é que o horrível terrível me chama?
que quero com o horror meu,
porque meu demônio é assassino
e não teme castigo.
eu me vivifico toda no meu instinto
feliz de destruição.
-Clarice Lispector
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