Durante uma aula qualquer de matemática, meus olhos vagueiam entre os números e a janela. A luz branca forte machuca meu olhos, e o ar condicionado direcionado a minha cabeça me esfria mais do que deveria como se tentasse congelar minha mente antes que ela me me mate. Meus pensamentos viajam entre palavras do professor e gritos silenciosos da minha mente.
Eu quero tanto viver, mas há dias em que desistir parece tão mais sedutor. Flerto com meu suicidio em silêncio todos os dias. Não só pelo ato em si, claro que ele é tentador, mas oque mais me prende é a reação que isso causaria, quem acharia meu corpo? Um amigo próximo, uma monitora curiosa ou apenas uma colega de sala matando aula? Chorariam ou apenas ficariam chocados? Será que alguém sentiria culpa?
Me imagino morta, esquecida no fundo da sala durante a aula de educação física. Minha carniça apodrecendo aos poucos, assim como minha alma que já pereceu a muito tempo. Penso por quantas semanas meu nome se tornaria citado até ser esquecido mais uma vez e substituído por alguma outra fofoca fútil escolar. Apesar de gostar muito mais da ideia de um tiro final para exterminar meu último pensamento, considero muitas outras maneiras de terminar com essa mente tão barulhenta. Pedir para ir ao banheiro e me sufocar com um cinto seria tão tentador se ao menos eu tivesse como amarrá-lo em algum lugar... a pressão que o cinto faria contra o meu pescoço avermelhado, e o ar quente e abafado do banheiro aquecendo meu corpo que se tornaria frio mais tarde, a respiração ainda mais fragilizada e dolorosa, tudo me parece tão atraente.
Ou até mesmo algo mais relaxante como me drogar até ter uma overdose, a ideia de poder chapar antes da morte é tão libertadora que me faz esquecer por um minuto que eu ainda sou nova demais para utilizar substâncias do tipo.
Mas as vezes penso que talvez prefira algo mais teatral. Pular do último andar ao fim de uma sexta feira como um desfecho final para a semana. Imagino como seria os gritos e a multidão de pessoas olhando para cima, não porque realmente se importam, mas porque querem ver se eu teria coragem para praticar tal ato. O vento forte bateria contra meu rosto enquanto a queda pareceria mais lenta do que realmente é, tudo se tornaria tão mórbido quando escutassem o som de ossos quebrando ao tocarem o chão de cimento tão duro quanto o coração ignorante de cada uma daquelas pessoas.
A ideia seria ainda mais cativante se eu pudesse estar presente para ver cada reação, tal como um fantasma, mas apenas por alguns dias antes que isso fosse enterrado junto ao meu corpo em uma cova de esquecimento. Eu gostaria de ter certeza que ao menos em minha morte eu seria notada.
Minha mente vive morta, esmagada por pensamentos que se atropelam. Assim como Freddie Mercury disse: "eu não quero morrer, mas as vezes desejava nunca ter nascido."
Brincar de ser invisível é quase reconfortante se não fosse deprimente, a ideia de que as pessoas não podem me notar até que algo estrondoso aconteça é tão real que quase chega a me convencer, isso claro, antes que alguém chame meu nome e me tire do meu tão fascinante delírio para me pedir algo estúpido como se eu fosse apenas um pedaço de carne estúpido que servisse para resolver os problemas que eles não conseguem solucionar sozinhos.
Mas assim que minha presença não se torna mais útil sou liberada e então volto a escutar meus gritos internos que me consomem assim como urubus fazem com cadáveres abandonados, e então me vejo cada vez mais longe. Me imagino nos Estados Unidos, onde armas são de mais fácil acesso, talvez se estivesse lá isso tudo já tivesse se tornado real, ou talvez eu fosse covarde demais para realizar tal ato tão definitivo.
Talvez seja por causa dessa barreira que ainda permaneço em vida, o pensamento de não conseguir finalizar meu último suspiro com sucesso é mais assustadora do que meu dia dia atual, os olhares com nojo e repulsa por ter falhado até mesmo na própria morte, ou o cuidado excessivo que os adultos tomariam comigo me aterroriza, imagine então os berros e sermões que seriam ditos até o dia final por natureza? As pessoas agora citariam meu nome com receio, como se me resumissem a um suicida e minha imagem estaria arruinada para sempre. É assustador ao ponto de me fazer parar de pensar na ideia, pelo menos por alguns minutos.
Mas isso me faz pensar em como as pessoas conseguem ser duras. A rotina esmaga a empatia das pessoas, eles teriam mais pressa para limpar minha sujeira do que em entender minha dor. As pessoas não olham para quem está desmoronando a menos que seja barulhento demais para ignorar.
E mesmo que percebessem, o mundo não pode parar só porque uma jovem fraca e inconveniente decidiu estragar o horário escolar com sua morte importuna.
E suas cartas mal escritas.
Comments
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Celeste
Nossa... que relato, viu! Muito bem escrito e tocante.
Muito obrigado, estou tentando melhorar na escrita e comentários como o seu são de grande incentivo
by bia; ; Report