Pura Consciência

Eu gosto de ficar sozinha.

Gosto da sensação de ouvir só os meus próprios pensamentos.

Gosto de lembrar que por mais que tenho amigos e pessoas a quem eu me importo e que se importam comigo, no fim será apenas eu dentro do caixão, apenas eu.

Quando eu saio a noite e ando pelas ruas, eu tento me ver fora da realidade, fora daquela casinha apertada na minha mente. 

Poder me dissociar do planeta, fingir que sou apenas pura consciência vagando pelo espaço... Isso ajuda.

De repente, eu não existo; nada disso existe e eu não estou aqui sentada no banco da praça; eu não estou ouvindo nenhum grito abafado que eu não sei se alcançou minha boca ou não.

Eu não vejo, eu não escuto, eu não sinto mais nada.

O frio da noite, passa pela minha pele de uma forma tão suave que é como se não me atingisse.

Porque, claro, não atinge.

Mas nem sempre é suficiente...

As ruas escuras, por alguns momentos se iluminam. 

Eu consigo ver as pessoas, os carros, e ouvir as músicas que saem de caixas de som na calçada de alguma casa.

Eu não sou mais um nada e a realidade está aqui bem na minha frente, esperando ser encarada.

Não posso evita-la. 

Porém, teve uma vez, uma única vez em que não havia uma cidade e não havia pessoas numa cidade... Não havia eu.

Uma vez, em um penhasco.

Afastado de tudo que existe, em um lugar que eu poderia fingir que não existe.

Algo além do espaço-tempo, fora do planeta.

Vazio.

Sem cheiros, sem sons.

Mas talvez eu quisesse que alguém me encontrasse.

Talvez, quando estou sozinha, contemplando meu silêncio, eu gostaria que alguém me visse.

Me enxergasse.

Eu acho que quando estou na rua, sinto lá no fundo o desejo de aparecer outro ninguém pra ser sozinho comigo.

Outra pura consciência que não esteja realmente lá.

No fundo, eu gostaria de não estar literalmente sozinha naquele limite. E poder saber que no fim, não é o corpo dentro do caixão que vai prevalecer vagando pelo espaço.