A inveja de viver à sombra de alguém, especialmente quando esse alguém é sua irmã, pode fazer você querer substituí-la e assim se tornar um monstro. “Noturno” é sobre isso.
Desde a infância, Jullie sacrificou todo o seu tempo e energia para se aprimorar na arte de tocar piano. No entanto, não importava o quanto se esforçasse e dedicasse tudo de si à música, ela não sentia que tinha o brilho. Sua irmã, Vivian, possuía o que chamam de talento natural que conseguia ofuscar sua “falta de amor” comparada à Jullie e sua falta de técnica. Vivian não precisava sacrificar sua vida para ser boa na música, pois era natural para ela, e isso despertava certa inveja em Jullie. Sua irmã tinha um belo namorado, era reconhecida por seu talento e era vista e admirada por seu professor, enquanto Jullie vivia à sombra da irmã e cobiçava tudo que ela possuía. Jullie havia sacrificado fins de semana, feriados e oportunidades de viver intensamente como adolescente, seja namorar, beijar ou perder a virgindade. No fim das contas, sua irmã, que sequer amava a música tanto quanto ela, ao menos na visão dela, conseguia tudo o que Jullie mais almejava sem “esforço”.
O filme mistura muito bem o suspense e o drama que se desenrola no conservatório. O ambiente pouco iluminado e predominantemente preenchido por cores sombrias mostra a frustração de Jullie, que se vê sufocada e pressionada a alcançar a excelência, enquanto é obrigada a presenciar sua irmã obtendo êxito em tudo aquilo que ela mais anseia. Pouco a pouco, os cenários vão ganhando cor e se ampliando, mostrando o aumento de sua autoestima e confiança, enquanto, simultaneamente, a “luz” de Vivian vai diminuindo. O fim do filme é marcado por uma conversa nua e crua entre as irmãs, que abrem o jogo sobre tudo que aconteceu nos últimos seis meses. Vivian se sente desgostosa por ver sua irmã tirando tudo que lhe pertencia, pois sempre soube o quão ambiciosa e gananciosa Jullie era. No entanto, a ideia de “fracasso” para ela não aparenta ser algo completamente inaceitável, diferente de Jullie, que se recusava a “permanecer na mediocridade”. Jullie, agora tendo conseguido tudo que sempre quis, volta a sentir a dor sufocante das expectativas alheias sobre seus ombros e, sem o apoio da irmã e depois de ouvir algumas verdades, é obrigada a subir no palco para apresentar o solo que tomou de Vivian. No fim, Jullie sacrifica sua alma pela música e entende, ao que parece, o fardo de sacrificar tudo o que você é em nome de algo.
Na minha visão, nunca houve de fato um pacto sobrenatural para que o talento de Vivian fosse roubado e transferido para sua irmã. A ideia de um pacto foi criada apenas para que Jullie não se sentisse tão mal com tudo aquilo que estava fazendo e permitindo que acontecesse. É como se seu inconsciente estivesse criando essa narrativa, com a ajuda das altas doses de remédios ansiolíticos que ela tomou ao longo do filme, a fim de amenizar a culpa por “arruinar” a carreira e a vida de Vivian.
Comments
Displaying 1 of 1 comments ( View all | Add Comment )
not_ian
nunca vi esse filme, mas achei a premissa e a sua visão bem interessante. vou dar uma olhada onde eu consigo encontrar pra assistir.
Report Comment
Encontrei o filme através do Telegram. Use esse link, entre e peça o filme que eles enviam link: https://t.me/filmeseseriesbrasilllllllll
by LittleDreaming; ; Report
valeu!
by not_ian; ; Report