Gris - Arte em forma de jogo
Com certeza um dos jogos mais lindos e artísticos que eu já vi é gris. Literalmente cada frame desse jogo pode criar um quadro perfeitamente lindo, além da trilha sonora que sempre me emociona e me dá arrepios. Mas uma coisa sobre gris é que ele é muito ligado aos diferentes estágios do luto, o que faz completamente sentido com a história do jogo. Mesmo sem nenhuma palavra, gris consegue contar toda uma história muito cheia de emoção. Durante o jogo, é possível encontrar algumas "estrelas" que são especiais. Se você tiver sorte e vontade de encontrar todas, você libera uma cena especial no final do jogo que mostra a mãe da gris (personagem principal), dando a entender que ela perdeu a mãe dela. Logo, existem algumas teorias não confirmadas sobre o jogo falar sobre as fases do luto, já que ela perdeu uma pessoa próxima e importante a ela. Então vou falar sobre tudo que enfatiza esses estágios do luto durante o jogo.
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O primeiro estágio do luto é a negação. No começo do jogo, gris esta em cima de uma mão (que depois a gente descobre que é de uma estátua da mãe dela). Mas, ao tentar cantar como faz todos os dias, a mão começa a desmoronar, como se o mundo dela desmoronasse. Ela tenta ir atrás daquilo que refugiava e protegia ela quando as coisas não davam certo, mas é como se aquilo tivesse sido tirado dela. Então ela cai por um bom tempo até atingir o chão. O mundo muda de cor, fica cheio de ruínas e tudo fica completamente branco e cinza, ela anda devagar e sem ânimo nenhum, sendo assim, pode considerar essa parte como a negação. De acordo com Kubler-Ross, psiquiatra criador dos cinco estágios do luto, a negação é quase como um estado de choque, como algo que não parece real e que é difícil de aceitar. Portanto, o mundo branco pode representar um pensamento de que aquele mundo não faz mais sentido sem aquela pessoa por perto, perdendo suas cores e sua vida.
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O segundo estado do luto é a raiva. Depois de caminhar lentamente pelo mundo branco, ele começa a ganhar vagarosamente um pouco de cor, visto que ela encontra um pedaço da mão caída, enfrentando a realidade do que aconteceu, tendo uma explosão de emoções e liberando a primeira cor. A cor que primeiro aparece é a vermelha, que muitas vezes é utilizada para representar a raiva e a revolta. Com o passar do tempo, tempestades de ventos cada vez mais vermelhos começam a jogar a personagem pra trás, como se tentassem desencorajar ela de sair daquela raiva que sentia. Novamente, para Kubler-Ross, a raiva é uma dor interna, um sentimento de abandono toma conta da pessoa por conta daquele que partiu, logo, saindo de algo sem emoção (negação) para uma emoção agressiva (raiva), que muitas vezes vem pelo vazio existencial que é deixado pela morte.
Ao caminhar, antes mesmo das tempestades de areia vermelha, a gris encontra um palácio. Esse palácio vai se tornar importante porque ele auxilia na chegada no objetivo final, chegar nas estrelas (ou na aceitação). Durante o jogo, é possível conseguir estrelas que formam constelações, que são usadas como ponte para a personagem passar, além de algumas habilidades que ajudam também a enfrentar, por exemplo, as tempestades de areia. Essas habilidades podem ser entendidas como coisas que, ao longo das fases do luto, vieram à vida de gris para facilitar, resistir e dar apoio, sejam elas pessoas, animais, objetos, hobbies, entre outros. Porém, durante o game são representadas como habilidades que facilitam em quebra-cabeças que vem ao longo do tempo dentro do game.
Além disso, depois das tempestades de areia, ela encontra um palácio enorme. Dentro dele existem estátua gigantes que conforme se passa andando, elas vão se fundindo em pilares. Entretanto, ela cai em um lugar escuro e encontra um "reflexo", uma sombra, que é idêntica a ela. As sombras que formam esse reflexo acabam fugindo e levando ela para fora do estágio de raiva. Com o passar do jogo, essas sombras vão tentar "atacar" ela e desviar ela do objetivo final, que é a aceitação, elevando ela acima para depois colocá-la para baixo novamente.
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Logo após a raiva, o mundo fica "equilibrado", com pilares e construções que trabalham a favor dela e não contra ela, quase como se ela visse o mundo de uma maneira diferente. A terceira fase é da barganha, também chamada de negociação. Nessa fase, a culpa geralmente vem de uma forma grande e pensamentos que provêm do "e se?" começam a surgir. Esse estágio é representado pelas cores azul e verde e pela criação de natureza no jogo. Nesse momento, a gris se encontra em uma floresta e encontra um bloquinho (que é tipo um bixinho em formato de bloco). Por todo esse momento, ela cuida dele e o trata de forma gentil, como se tivesse a necessidade de protegê-lo. O bloquinho consegue "acessar" túneis que ficam no subterrâneo, podendo se entender que ele acessa aquilo que é mais profundo dos sentimentos da gris, cuidando de forma que retribua a maneira que ela cuidou e ajudou a encontrar seu caminho.
A penúltima fase, a da depressão, é a mais longa durante o jogo. No começo, a gris não possui a habilidade de nadar até o fundo das águas que surgiram no mundo, como se ela não tivesse "coragem" de se aprofundar e conhecer a si mesma. Depois de muito tempo, ela ganha essa habilidade e se aventura nas profundezas das águas, mas aquela criatura feita de sombra persegue ela. No entanto, uma tartaruga (que pode representar um amigo, familiar ou até mesmo um animalzinho), surge e dispersa aquela sombra que a perseguia, como se estivesse ali em todos os momentos necessários, principalmente nesse processo de explorar a si mesma, protegendo e sendo a luz na escuridão, um apoio para gris. Porém, ao chegar novamente na estátua que representa sua mãe, as sombras a quebram por inteiro, como se quebrassem novamente seu refúgio, adentrando o processo de depressão. No fim, elas tomam a forma de seu rosto, tentando mudar a mente dela para pensar que é culpa dela. A mente de gris desaba, tudo volta a ser branco e vazio e cai em um lago de sombras. Ao subir sobre os destroços da estátua, as sombras tentam "engolir" ela por inteiro.
A gris perdeu a mãe, mas não é só sobre isso. A história do jogo é sobre a jornada dela. Sobre se sentir vazio e continuar seguindo em frente porque é isso que resta pra se fazer. É enfrentar o que está acontecendo e ser atingido com diversas emoções como raiva, angústia e tristeza, depois resistir a isso e transformar isso em uma forma de aprendizagem, em pilares equilibrados que funcionam ao seu favor. É enxergar o mundo de uma forma diferente e saber que, mesmo durante toda sua dor e sofrimento, ainda existe a capacidade de ajudar alguém que talvez esteja tão perdido quanto você e saber que essa ajuda também vai ser retribuída de alguma forma. É graças ao aprendizado e experiências que ela consegue enfrentar as sombras que tanto perseguiram e tentaram a puxar pra baixo. É sobre mergulhar nos sentimentos mais profundos dela e descobrir que mesmo quando tudo parece perdido e sem razão, existirá alguém para te proteger. É sobre explorar sonhos do futuro com tudo o que aprendeu para finalmente olhar o mundo de uma forma diferente.
Mesmo que as sombras tentem fazer a mente dela para faze-la pensar que sua mãe nunca mais vai estar lá, ainda é possível olhar ao redor dela e ver tudo o que foi deixado ali com ela, ela faz parte da gris. Ela vai viver dentro dela pra sempre, ela faz parte daquilo que constrói a gris, como se fosse uma estátua decorando um palácio. Ao aceitar, as sombras somem e o mundo volta, finalmente, a ter suas cores. Por fim, é isso, a aceitação. Aceitar aquela realidade, aceitar que não existe problema em sentir aquelas emoções, aceitar aquilo que se foi. E assim, ela consegue subir para o céus, junto com as estrelas que formam uma ponte ao longo da sua jornada, chegando no estágio final, a aceitação.
Gris. Esse jogo é absurdo, não só lindo pelos visuais, mas trilha sonora e toda história que é contada. O jogo fala sobre aquilo que se foi, mas que é difícil de aceitar. É sobre dar importância as suas emoções e entender e equilibrar elas, além de entender que não existe problema em sentir o que você sente. E entender que aquilo que você ama sempre faz e fará parte de você, mesmo que agora vocês não estejam juntos. A estátua da gris era a mãe dela, mas é apenas uma metáfora sobre perder algo que é importante para você, seja um amigo, um familiar ou um bixinho.
(blue, onde quer que esteja, obrigado)
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