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Category: Movies, TV, Celebrities

Presença de Anita é o prelúdio do que teria acontecido com Dolores, Lolita, caso Humbert tivesse tido êxito em seu plano sórdido

 Eu tentei ser o mais aberta possível, assim como fui ao assistir Lolita, mas Presença de Anita tem tantas camadas que nem sei por onde começo!

 Para começar, deixo claro que, do meu ponto de vista, Anita não é uma vilã nem tampouco uma "vagabunda" que se diverte causando discórdia. Ela é, na verdade, uma criança traumatizada no corpo de uma jovem mulher. Várias vezes ao longo da trama ela se refere a Armando como um cavalheiro gentil, o único que realmente se importou com ela durante sua infância conturbada. Na realidade, porém, ele não passou de um criminoso pedófilo que se aproveitou da carência e ingenuidade de uma menina para fazê-la acreditar que aquele comportamento era normal e aceitável. É simplesmente repulsivo perceber como Anita foi alienada ao ponto de colocar Armando num pedestal, como se ele fosse uma figura etérea e intocável. 

 Mesmo ao perceber, aos poucos, o que Armando realmente representava para Anita, Nando minimizou esse passado perturbador e tentou ignorá-lo para preservar sua própria fantasia em relação à garota. Seu primeiro casamento fracassou, evidenciado pela relação distante com Luiza, sua filha mais velha, que tem a mesma idade de Anita. Sua segunda esposa, apesar de doce e afável, é vista por ele como desinteressante e sentimental demais. Essa visão cruel sobre ela só se intensificou quando a família dela – que ele desprezava tanto quanto eles o detestavam – os convidou para passar o Natal e o Ano Novo na cidade interiorana onde viviam. Sem inspiração para escrever ou viver naquela rotina monótona, que ele suportou por nove anos, ele enfim encontrou algo que sempre cobiçou naquele "fim de mundo": a "mulher" de seus sonhos, a inspiração que ele acreditava poder dar sentido à sua vida medíocre e miserável.

 No entanto, Anita é tão imprevisível quanto um furacão e por mais excitante que fosse, ela era uma presença passageira e irreal. O que Nando não contava era que sua obsessão doentia por ela falaria mais alto que a razão, levando a uma espiral de morte, angústia e tristeza para todos ao seu redor. O desfecho da história é marcado por sucessivos eventos trágicos e complexos, mas não totalmente tristes. Nando, ao provocar a morte de Anita e, consequentemente, do filho cuja existência ele desacreditava, atribuiu a culpa a Zezinho, que, entre a vida e a morte por ter tentado salvar sua amada, não podia se defender e revelar a verdade. A justiça, porém, chegou mais rápido do que o esperado e a promessa de Anita se cumpriu: ela morreria por amor, mas Nando iria junto.

Nos minutos finais vemos um paralelo entre Nando, agora atormentado pelo fantasma de Anita – ou pela projeção de seu inconsciente sobrecarregado pelo remorso dos assassinatos que cometeu – e a ceia de Natal da família de sua ex-esposa, agora com seus dois filhos, que finalmente podiam formar uma família verdadeira com Luce Helena. Ao mesmo tempo, Nando e Anita, ou a personificação de sua culpa, dançam e se amam uma última vez em meio ao fogo que consome a casa de Anita. Agora todos estão livres de suas dores, pecados e tristezas, seja na vida ou na morte.


Pode não ter sido o fim feliz ou agradável que muitos desejavam para Anita, mas é, sem sombra de dúvidas, o final real que eu esperava desde o início.

(Mas o que Anita era afinal de contas? Uma puta, uma vítima, uma cínica dissimulada ou uma sonhadora? Sinceramente, eu não sei. Mas, para mim, Anita sempre será inesquecível, assim como Cíntia, Maria ou Letícia.)


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